Na visão do especialista | Franciso Zapata
De forma geral, como você enxerga o posicionamento das empresas brasileiras em relação a customer experience e customer success?
Em geral, eu vejo que o mercado segue uma tendência que está aumentando nos últimos anos, que é querer entender direito Customer Experience e Customer Success, o ponto ainda está muito imaturo.
As empresas ainda confundem muito a experiência do cliente com o sucesso do cliente e com o atendimento. Cada uma delas é algo muito importante por si só, mas são coisas diferentes, são pedaços de uma centralização total no cliente. Eu vejo que o posicionamento das empresas brasileiras é esse, de querer entender.
Quando esta preocupação maior com o cliente tomou mais força, faz uns 10 anos, vi um movimento em que as empresas em geral assumiram que tinham entendido tudo de uma só vez. Assim, a grande diferença que eu vejo agora é que elas estão percebendo que tem uma diferença grande entre essas várias terminologias, métodos e estratégias, então já é um passo.
Na sua visão quais são as tendências em Customer Experience, considerando todo o ecossistema, metodologias, ferramentas, profissionalização e foco das empresas?
Eu sinto tendências claramente diferentes entre o lado dos fornecedores de soluções e métodos, e o lado das empresas que querem se centralizar no cliente.
Do lado dos fornecedores, a turma está anos luz à frente em termos de tecnologia. Tem gente trabalhando com inteligência artificial, com modelos de aprendizado automatizado, com detecção de expressões humanas e sua tradução em sentimentos e tantas outras inovações.
Além disso, há uma tendência adicional de querer criar uma plataforma de gestão para os clientes, o que é fantástico. Significa unificar toda a informação sobre os clientes, o que agiliza muito a tomada de decisão. Então, eu diria que “plataformas de customer” são uma tendência para o lado dos fornecedores.
Entretanto, do lado das empresas que querem se centralizar no cliente, eu vejo que muitas ainda estão ainda perdidas no conceito. Elas nem sabem direito o que é customer experience ou customer success, e de repente tem projetos querendo implementar coisas extremamente tecnológicas só pela inovação. A maioria acaba virando um elefante branco que ninguém sabe direito como usar ou como justificar o investimento.
Para estas empresas existe também uma tendência de querer provar resultados financeiros de CX. Isso porque, para essas empresas, a mentalidade ainda é muito de “quero dinheiro rápido”. Em geral, é assim: “me prova que esse tal de Customer Experience vai me economizar dinheiro ou vai me trazer mais dinheiro”. Mas a gente sabe que, muitas vezes, é uma jornada longa de cinco a sete anos, para uma centralização no cliente bem feita.
Então, a tendência das empresas é querer provar logo esse retorno para os seus boards. Os boards ainda não perceberam que a estratégia de centralização no cliente necessariamente envolve toda a empresa, e que o retorno vem pela fidelização e aumento de LTV dos clientes, o que não se prova em três meses.
Para empresas que estão iniciando o monitoramento de experiência de clientes, quais indicadores são imprescindíveis para análise de satisfação e fidelidade dos seus clientes?
Na atuação de minha consultoria, a Kentricos, antes de falar de indicadores específicos, costumamos entender quais tipos de indicadores existem. E indicamos, à medida em que a empresa evolui, pensar nestes dois tipos de indicadores como visões complementares para entender o cliente.
Um tipo é o relacional, que seriam indicadores de mais amplo espectro em relação à marca, ao relacionamento de toda a vida com algum cliente. O NPS entra aí, e me refiro ao NPS original do Fred Reichheld e não a diversas variações que começaram a aparecer. O NPS foi travestido de tantas formas, que inventaram um tal de NPS transacional até. Ele não se encaixa no NPS original do Fred, que por definição tem que ser relacional e não transacional.
Mas então, um tipo de indicador é o relacional. O outro tipo, aí sim, o transacional, seria um complemento excelente. O mais comum é o CSAT, ou você também pode pensar no CES como um indicador transacional, ou ainda pesquisas específicas e pontuais para obter informações específicas do seu nicho, que nenhum dos indicadores genéricos traz.
E aí entra nossa aversão a “modismo de métrica”. Se você tem uma métrica que criou e ela está adequada ao seu nicho de mercado e é transacional, maravilha, grude nela e use como parâmetro histórico. Não mude a métrica para o futuro, justamente para poder usar o histórico que você já tem dessa métrica. Mas ela continua sendo uma métrica transacional. Assim, indicamos no mínimo isso: uma relacional para ver o big picture e ver as grandes oscilações em relação à marca e uma transacional para ver o granular, dar um zoom e entender detalhadamente as influências nessa métrica de mais amplo espectro.
Na sua opinião onde as empresas mais erram em termos de centralidade e experiência de clientes
Eu acho que o primeiro grande erro é não entender os conceitos. Desde o início, há mais de dez anos, eu vejo a mesma coisa, as empresas acham que entendem o que é e, por acharem que entendem, saem já fazendo coisas que não encaixam numa metodologia e estratégia mais abrangentes de centralidade.
Por exemplo, confundir centralidade no cliente com a experiência do cliente, ou com sucesso do cliente, ou ainda com atendimento ao cliente. E ainda tem outras subdivisões, como “customer advocacy”, VoC, lealdade, suporte, auto-atendimento etc… mas resumindo, um erro grande é não compreender cada um desses conceitos, estratégias e métodos.
Tem empresa que nem entende Customer Experience como estratégia, entende CX como “área de atendimento travestida de modernidade”, digamos assim. Então, devemos entender e compreender, de fato.
O segundo grande erro, sinto que é a implementação. As empresas reduzem todas as estratégias de centralidade a alguma área, elas querem ver ali um departamento, uma porta com uma sala e pessoas, e um rótulo escrito “CX” ou “CS” e tal.
Na verdade, Customer Experience e Customer Success são estratégias de como centralizar a empresa no cliente. Elas não são mutuamente exclusivas também. A Kentricos sempre advoga adotar as duas estratégias, o que maximiza o impacto da centralidade no cliente.
Mas a implementação, então, é o segundo erro, porque as empresas acabam reduzindo a uma área, ao invés de entender que é uma mudança corporativa, cultural e estrutural de sua governança inteira, e aí você vê alguns fracassos de implementação acontecendo.
Na sua opinião o que uma empresa verdadeiramente centralizada no cliente e com maturidade em termos de Customer Experience tem de diferente de empresas menos evoluídas nesse quesito?
Eu acho que nas empresas verdadeiramente centradas no cliente você não tem que lutar lá dentro para mostrar como é importante centralizar no cliente. Muitas delas é formada de startups, pois é mais fácil uma empresa nascer centrada no cliente do que se tornar uma.
Mas vamos falar de empresas maduras também, que já vêm de décadas de operação, e naturalmente, originaram-se num cenário onde o cliente era visto como só um custo, só um personagem a ser sugado para obter lucro e depois descartar. Essas empresas podem se tornar centradas no cliente sim. Há várias evoluções a serem feitas, vários atritos têm que ocorrer, então algum impedimento tem, mas o que eu quero dizer é que mesmo essas empresas, ao se tornarem centradas no cliente percebem uma mudança cultural.
Eu diria que esta cultura é o que diferencia essas empresas. Elas visam lucro, claro, sempre tem que visar o lucro, uma empresa é feita para isso, só que desenham suas ofertas para que lucro para a empresa necessariamente venha com valor real entregue a seus clientes na forma de experiências construtivas, positivas e consistentes. Isso porque elas tem certeza que, ao beneficiar o cliente em primeiro lugar, de uma forma ou de outra o lucro vem.
Então, eu diria que essa é a grande diferença das empresas centradas no cliente, elas realmente seguem a crença de que, ao beneficiar o cliente, elas estarão se beneficiando eventualmente.
Só um complemento, nas empresas centradas no cliente, o alto board de lideranças é centrado no cliente também. O que eu quero dizer com isso? Todo board tem seus membros com interesses que influenciam muito na empresa. Não adianta a empresa inteira dizer que é centrada no cliente se o board não é. Então eu diria que essa é outra diferença nas empresas centradas no cliente, o board diretivo, a alta liderança, é genuinamente centrada no cliente.